As técnicas de diminuição do teor alcoólico dos vinhos são ferramentas fundamentais que permitem combater os efeitos do aumento das temperaturas. Para além da possibilidade de reduzir o desequilíbrio sensorial e a sensação de ardor que pode ser provocada por um teor alcoólico excessivo, estas técnicas respondem também a uma exigência do mercado, uma vez que os consumidores procuram cada vez mais produtos com baixo teor alcoólico. Por último, respondem ainda à necessidade económica de evitar a tributação das bebidas espirituosas (limite vinho/ espirituosa fixado em 14% v/v nos EUA).
Para diminuição do grau alcoólico final dos vinhos, podem ser tomadas medidas, com maior ou menor grau de eficácia, seja na vinha, durante a fermentação, ou no vinho. Na vinha, são possíveis diferentes práticas: aplicação de técnicas de viticultura para reduzir a acumulação de açúcares nas uvas, como a remoção de folhas ou a poda tardia. Se estas práticas aplicadas na vinha tiverem um impacto relativamente baixo, podem ser consideradas várias técnicas ao nível da gestão da fermentação para limitar a produção de álcool. O IFV publicou um relatório com os resultados mais recentes da sua investigação relativamente a este tema.
Na vinha: reduzir a acumulação de açúcares nas uvas
A primeira abordagem consiste em limitar/evitar concentrações excessivamente elevadas de açúcar, o que resulta num menor teor alcoólico potencial. Desde 2016, o IFV Occitania tem vindo a realizar ensaios para comparar a eficácia de certas práticas vitícolas na redução do nível de açúcar nos bagos.
- Atuar sobre a superfície foliar
A desfolha tardia severa consiste na remoção manual ou mecânica, durante o período anterior ao pintor, de cerca de 30% da superfície foliar da copa acima dos cachos. A técnica de desponta severa é semelhante à da desfolha para limitar a fotossíntese com uma redução de 30% da vegetação abaixo do ápice. Estas técnicas têm um impacto maior ou menor na dinâmica de acumulação de metabolitos primários nas uvas e podem resultar numa diminuição do teor alcoólico entre 0,1 e 0,8% vol.
O nível de desfolha e de desponta é difícil de controlar, uma vez que depende das características da vegetação (altura e espessura) e pode conduzir a uma resposta variável. A qualidade e o rendimento do vinho não são afetados.
A pulverização de um regulador de crescimento da classe das auxinas (ácido 1-naftilacético, ANA, utilizando um produto aplicado em arboricultura) foi igualmente estudada, mas não foi observado qualquer efeito na vindima, contrariamente ao ilustrado na bibliografia em ensaios de laboratório.
- Poda tardia
De acordo com os ensaios do IFV, a poda permite alterar sistematicamente o ciclo da videira, sobretudo se for efetuada tardiamente. No entanto, no momento da vindima o impacto no grau alcoólico provável não é sistematicamente visível, mas o impacto no rendimento e no teor de polifenóis pode ser significativo.
Por exemplo, foram testadas e comparadas duas datas de poda com uma poda clássica de Inverno em Merlot de Gaillac AOP: após o abrolhamento e na fase de 4-6 folhas livres. Para a poda efetuada no abrolhamento, observou-se um atraso fenológico de 1 semana na floração e no pintor. Na fase de 4-6 folhas, o atraso pode atingir 2 semanas. No entanto, aquando da colheita, o atraso é compensado por pequenas diferenças observadas nos parâmetros de maturação.
A poda tardia pode ser efectuada numa fase ainda mais tardia (8 a 12 folhas). Neste caso, a redução dos açúcares da uva pode ser maior, mas também podem ser observadas reduções de rendimento, consoante o ano.
- Vindimar com diferentes graus de maturação
Esta técnica é baseada na escolha de duas datas de colheita definidas em função do controlo d maturação, a fim de obter uma matriz com um baixo teor alcoólico potencial (vindvindima precoce) e uma matriz vindimada em plena maturação para elaboração de um lote após a vinificação.
Por exemplo, a colheita seletiva de Merlot da DOP Gaillac permitiu obter em 2019 um lote de maturação precoce com 11% de álcool potencial e outro lote de uvas maduras com 14%. A mistura resultou num gradiente de álcool entre 11,8% vol. e 13,7% vol. Os vinhos apresentaram também um equilíbrio na acidez diferente. Continuam os estudos sobre o impacto na qualidade dos taninos.
O impacto a longo prazo destas práticas no vigor e durabilidade das vinhas está ainda por avaliar.
Na adega: gestão da fermentação para reduzir o teor alcoólico
Estão disponíveis várias técnicas de gestão da fermentação para limitar a produção de álcool. O IFV realizou vários ensaios sobre a seleção de leveduras e processos de evaporação do álcool.
- Selecção de leveduras
A redução do teor alcoólico é possível através da seleção de leveduras: seja pelo seu impacto no rendimento alcoólico, ou no metabolismo secundário da transformação dos açúcares, além do metabolismo da formação de álcool (formação de coprodutos: ácido láctico, glicerol).
O IFV testou diferentes leveduras. A grande maioria das leveduras não-Saccharomyces não têm a capacidade de realizar fermentações alcoólicas completas, pelo que foram adoptadas estratégias de inoculação sequenciais. Foram avaliadas as estirpes mais interessantes que permitiram uma maior redução do teor alcoólico dos vinhos. Em alguns casos, a qualidade sensorial dos vinhos foi afetada negativamente, na vinificação de tintos, devido a uma produção de ácido lático significativa. No entanto, o controlo da fermentação continua a ser uma opção muito promissora. Geralmente, combinada com intervenções vitícolas comprovadas permite, uma redução do nível de álcool que não é sistemática e mantem-se abaixo dos 2% v/v.
- Evaporação do álcool
A desalcoolização parcial do vinho pode ser conseguida por simples arejamento à temperatura ambiente e à pressão atmosférica. Uma desalcoolização de 2% v/v pode ser obtida com equipamento específico e um tratamento de 8 horas. Fatores a ter em conta:
Para otimizar a evaporação do álcool, é preferível manter uma higrometria na ordem dos 80%. Além de melhorar o rendimento do sistema, uma humidade elevada reduz a perda de vinho por evaporação de água.
A operação de evaporação provoca uma descida da temperatura do vinho.
A eficácia do processo de evaporação é favorecida por uma maior superfície de contacto com o ar.
Este processo não tem impacto significativo nas características analíticas clássicas do vinho, exceto no que diz respeito à perda de CO2. A gestão de eventuais contaminações microbiológicas (nomeadamente com bactérias acéticas e Brettanomyces) não foi considerada neste trabalho. A nível prático, a desalcoolização poderia ser aplicada apenas a uma parte do lote.
Na adega: práticas de pós-fermentação
Foram estudados diferentes processos em vinho acabado
- Destilação
Efeito difícil de prever diretamente devido ao elevado risco de perda aromática; pode estar associada à osmose inversa ou à nanofiltração, que permitem separar previamente uma mistura de água e álcool com quantidades mais ou menos pequenas de certos compostos (ácidos orgânicos, potássio, etc.).
O álcool recuperado no final da destilação é um álcool altamente concentrado (85 a 95% V/V) que pode ser recuperado diretamente pela destilaria. A destilação apenas pode ser efetuada por um operador autorizado.
- Desalcoolização por membranas
Foi estudado o processo MemstarTM AA, baseado em dois tratamentos sucessivos com membranas. Mais uma vez, a primeira fase é baseada na nanofiltração, que permite a extracção de um permeato composto principalmente por água e álcool. Em seguida, um contactor de membrana (sistema de membranas hidrofóbicas) permite extrair seletivamente o álcool contido na água do permeato obtido por nanofiltração. O permeato isento de álcool é então continuamente re-injectado no vinho, evitando assim concentrar o vinho tratado. O efluente produzido é rico em álcool (até 10%V/V) e representa 10-15% do volume de vinho tratado por grau extraído do vinho. Este efluente é considerado um resíduo.
- Coluna de Cones Rotativos/Spinning Cone Column (CCS)
Esta tecnologia permite produzir vinhos com baixo teor alcoólico (0,5%V/V) sem perda aromática. A concentração de álcool eliminada é elevada (redução de 60 a 80% da concentração inicial), o que limita as perdas de água. O tratamento é efetuado em várias etapas e o vinho passa duas vezes pela coluna rotativa.
Em primeiro lugar, é tratada uma fração do vinho. O volume é calculado em função do volume de álcool a eliminar para todo o vinho a desalcoolizar. A primeira vez que esta fração de vinho passa pela coluna, os compostos altamente voláteis (aromas) são extraídos numa pequena fração de álcool a uma temperatura de 30°C. Esta fração de vinho desaromatizado é então transferida para a coluna e o álcool é eliminado. Posteriormente, o extrato aromático é reintroduzido na fração desalcoolizada. Por fim, esta última fração é reintroduzida no volume total do vinho a desalcoolizar.
Este processo é muito interessante e respeita a qualidade organoléptica do vinho. No entanto, quando utilizado para desalcoolizações fortes (< 5% vol), pode causar alterações significativas na estrutura e no equilíbrio do vinho.
Por exemplo, com um modelo CCS de duas colunas, para tratar um lote de 100 hl de vinho a 15% V/V, será necessário
=> Para reduzir o grau alcoólico para 13,9%, tratar 10 hl de vinho em 30 min.
=> Para reduzir o grau alcoólico para 6%, tratar 70 hl de vinho em 3h30;
=> Para reduzir o grau alcoólico para 0,5%, tratar 100 hl de vinho em 5 horas.
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Fonte: IFV