A escolha da data de vindima pode modular a intensidade aromática das notas herbáceas/vegetais, de frutos frescos e de fruta cozinhada, ajudando assim o enólogo a produzir vinhos de diferentes estilos e equilíbrios. Este estudo, publicado na revista Oeno One, investigou a relação entre descritores sensoriais e compostos aromáticos em uvas de Merlot e Cabernet-Sauvignon, vindimadas de forma sequencial e os vinhos daí resultantes foram avaliados durante duas colheitas: 2012 e 2014.
O ajuste minucioso da data de vindima modulou os aromas do vinho jovem e teve impacto na intensidade dos aromas de frutos cozidos, tanto no Merlot como no Cabernet-Sauvignon. Não foi observada qualquer correlação entre o mosto e o vinho no que respeita à intensidade do aroma a frutos cozidos. Para observar um impacto na intensidade do aroma a frutos cozidos, foi necessário atrasar a data de vindima do Cabernet-Sauvignon entre 4 a 12 dias, em 2012 e 2014, respetivamente. Este valor foi de 7 dias para os vinhos Merlot (colheita de 2014). As furanonas, lactonas e cetonas apresentaram uma correlação elevada com a intensidade percecionada do aroma a frutos cozidos no vinho jovem. Além disso, as concentrações mais elevadas de γ-nonalactona, 3-metil-2,4-nonanodiona, lactona de massoia e furaneol foram detectadas nos vinhos Merlot elaborados a partir de uvas colhidas tardiamente. Nas concentrações observadas, estes compostos podem explicar o aroma a frutos cozidos detetado nos vinhos tintos. Resultados semelhantes foram obtidos para os vinhos Cabernet-Sauvignon elaborados a partir de uvas de uma colheita tardia
Os compostos voláteis produzidos pela via da lipoxigenase nas uvas podem estar implicados na evolução do aroma dos vinhos tintos provenientes da data de vindima sequencial, abrindo a possibilidade de gerir os perfis organolépticos através da decisão da data de vindima.
Assim, os resultados do presente estudo mostram como a colheita tardia de Merlot e Cabernet-Sauvignon pode induzir alterações significativas no aroma do vinho sem, surpreendentemente, alterações evidentes no aroma do mosto. Este estudo demonstra, portanto, que é difícil prever com exatidão o aroma do vinho através da avaliação sensorial do aroma do mosto. Além disso, foi demonstrado neste estudo que um pequeno atraso na vindima pode induzir uma modificação significativa das concentrações de açúcares no mosto e aumentar a intensidade dos aromas de frutos cozidos/secos. A base molecular destas alterações é o aumento do impacto dos compostos aromáticos no mosto e no vinho, como o furaneol, o MND, o (Z)-1,5-octadieno-3-ona, a lactona de massoia e a γ-nonolactona.
Por outro lado, trabalhos anteriores sobre o impacto da fermentação alcoólica na formação destes compostos, evidenciam que o metabolismo das leveduras desempenha um papel importante na revelação da fração volátil combinada que ocorre nas uvas quando colhidas tardiamente.
É necessária investigação futura para determinar se as observações relativas à evolução destes compostos aromáticos são aplicáveis a castas cultivadas em condições climáticas diferentes. Por fim, estes resultados podem ajudar a indústria vitivinícola a desenvolver ferramentas para evitar os aromas de frutos cozidos/secos nos vinhos, o que será cada vez mais desafiante no contexto das alterações climáticas.
Para saber mais: ler o artigo publicado na revista Oeno One e visualizar o vídeo em espanhol “Alterações climáticas e aroma do vinho tinto: aromas de frutos cozinhados“